A SAGRADA FAMÍLIA E NOSSAS FAMÍLIAS
A festa da Sagrada Família, nesta oitava do Natal de Jesus, vem nos recordar que Deus, ao vir ao mundo, quis que seu Verbo Divino se fizesse homem, nascesse e crescesse numa família humana. Em outras palavras: Deus quis ser família.
A Sagrada Família nos ensina o desafio de ser família. O evangelho de hoje nos apresenta Maria e José inseridos nos costumes e na piedade de seu povo, como bons judeus. Assim, Maria vai ao Templo, quarenta dias após o nascimento de seu filho para os ritos de sua purificação exigida pela Lei Mosaica (cf. Lv 2,2-4); a apresentação de Jesus (cf. Ex 13,2; 13,11 ss e Lv 5,7.12,8) e o oferecimento do sacrifício de resgate. São Lucas revela-nos a pobreza do casal, porque oferecem um par de rolas ou dois pombinhos, não tendo recursos para adquirir um carneiro. Mas, algo de inusitado acontece no momento.
O velho Simeão, vendo entrar o Menino Jesus nos braços de sua Mãe, reconhece nele o Prometido de Israel, o Messias esperado, a Luz para iluminar todos os povos e a Glória de Israel, o povo eleito (cf. Lc 29-32). A piedosa profetiza Ana dá graças a Deus e canta a vinda do Libertador do povo, que esperava por melhores dias. Tudo confirmava as palavras do Anjo na anunciação a Maria e a José.
Mas, se o momento é de exultação porque, em Jesus, é Deus mesmo que entra e toma posse de sua casa, o Templo de Jerusalém, a profecia de Simeão também anuncia o mistério da Paixão: “Este menino vai ser causa de contradição, tanto de queda como de reerguimento para muitos em Israel” (Lc 2,34b). Anuncia igualmente a participação corredentora da Mãe de Jesus, ao anunciar-lhe que uma espada traspassaria o seu coração; espada que vai se aprofundando pouco a pouco, até revelar-se na crueldade da Paixão de Jesus, quando estará de pé junto da cruz, sofrendo com ele.
Depois disso eles voltaram para sua casa e o Menino “crescia, tornava-se robusto, enchia-se de sabedoria; e a Graça de Deus estava com Ele” (Lc 2, 40). Mistério de alegria e dores também é a realidade de cada família humana. A Palavra de Deus nos ajuda a discernir os momentos e a vivê-los de modo diferente e construtivo. A primeira leitura comenta o quarto mandamento da Lei de Deus: “Honrar pai e mãe”. Honrar, é compreender, respeitar, obedecer, socorrer e cuidar deles com caridade, na velhice e na necessidade. Na Escritura, este é o único mandamento que traz uma recompensa, já neste mundo, porque se traduz em reparação dos pecados e vida longa e feliz com os filhos.
São Paulo, na Carta aos Colossenses, nos oferece uma série de conselhos para bem viver em família. Como escolhidos e amados de Deus devemos imitá-lo em Jesus, “na misericórdia, bondade, humilde, mansidão e paciência” (Cl 3,12b). Estas virtudes, chamadas ‘virtudes domésticas’ nos farão capazes de suportar os defeitos do próximo, perdoar e amar a todos e construir a paz, no exercício continuo da gratidão de uns para com os outros.
A leitura e meditação da Palavra de Deus é fonte de sabedoria para bem viver em família, porque nos desperta ao louvor, à adoração, à ação de graças e inspira as relações familiares da esposa, na solicitude e carinho para com seu esposo, no respeito e amor do esposo para com ela, e nos filhos, na obediência e na correção de vida. Convida ainda os pais a educar e corrigirem os seus filhos – corrigir é impor justos limites – sem violência, mas no diálogo e com carinho, como guias para Deus, de modo que sejam bons cidadãos neste mundo e vivam como cidadãos do céu.
Nosso tempo é de severas agressões à família humana: miséria de muitos; má distribuição dos bens; compromissos rompidos pela infidelidade, favorecida hoje pelas redes sociais; divórcio, violência familiar entre esposos e filhos, drogas, pornografia e a quebra dos valores que sustentam a grande família humana. A família constituída por homem e mulher, unidos numa só carne, num só coração e alma, é também ameaçada pelos legisladores e governos iníquos.
O testemunho da família de Nazaré, onde o Verbo se fez carne e quis ser educado como homem e membro de um povo, e o testemunho das famílias cristãs possam brilhar como luz para o mundo que, sempre mais, desconhece a Lei de Deus e se envereda nas trevas do erro e do pecado, muitas vezes elevado diabolicamente à condição de bem.
Que a luz que jorra deste Natal ilumine nossas famílias. Dê-nos ainda a consciência da necessidade premente de uma viva e eficaz pastoral familiar que faça brilhar a luz do Evangelho. E, neste ano, dedicado a São José, seu exemplo e proteção de pai e esposo da Mãe de Deus seja amparo para toda a Igreja, família de Deus, e para nossas famílias. Não nos esqueçamos de invocar seu especial patrocínio.
+ Dom Miguel Angelo Freitas Ribeiro