NO DESERTO DA PROVAÇÃO
Na Quarta-feira de Cinzas, já ouvimos a Palavra de Jesus que nos convoca à conversão e à fé no Evangelho. Fomos chamados a rezar mais, fazer penitência e à partilha do que possuímos. O Evangelho é a própria pessoa de Jesus Cristo. Nele, que não cometeu pecado algum, o Imaculado Verbo de Deus que se fez homem e desejou se submeter às tentações da fraqueza humana, temos nossa força e nosso exemplo de como viver neste mundo de prova, porque somos todos devedores do pecado. São Mateus e São Lucas nos relatam que Jesus as venceu pela Palavra de Deus escrita no Antigo Testamento, porque Ele quem nos falou, pelo Espírito Santo, através dos profetas.
Neste domingo, São Marcos nos apresenta a tentação de Jesus no deserto, de forma muito resumida, diferentemente de São Mateus e São Lucas que a especificam em três pontos, que correspondem às três tentações de Adão e Eva no paraíso terrestre e, portanto, às três concupiscências que trazemos como herança do pecado original. O pecado transformou o Jardim do Éden em deserto. Adão e Eva não mais conheciam da Deus e tinham dele medo e não mais amor. São Paulo diz: “Foi o pecado, portanto, que, aproveitando-se da ocasião que lhe foi dada pelo preceito, excitou em mim todas as concupiscências (Rm7,7).
As três concupiscências (1 Jo 2,15-16) resumem todas as tentações humanas: o prazer, seja pelo excesso de comida, de bebida, o uso de drogas e o sexo sem responsabilidade e fora do matrimônio; a avareza e o poder ou desejo de dispor de tudo para si; e a vaidade, a tentação do aparência e do orgulho de si mesmo.
Quem conduz Jesus ao deserto é o Espírito Santo, que havia descido sobre Ele por ocasião do batismo de João. Ele vai ao deserto para ser provado e vencer o diabo, satanás, o adversário da humanidade e de Israel, aquele que acusa os justo diante de Deus. Por 40 dias e 40 noites, Jesus jejuou, orou e foi tentado pelo diabo, quando sentiu fome. Como Noé, nos 40 dias e 40 noites do dilúvio, que foi também foi tentado em sua fé pelo desprezo dos seus contemporâneos. Como o povo de Israel, que permaneceu por 40 anos no deserto, e foi muitas vezes tentado e provado. Estamos sempre em guerra espiritual com os inimigos de Deus.
Na Quaresma, recordamos os 40 dias de Jesus no deserto, para que nos convertamos. São dias de retiro espiritual, para vencermos as tentações do mundo: a carne, o prazer e a riqueza.
No final de 40 dias, Jesus foi servido pelos anjos como Noé, como Elias e como o novo Adão. Com Noé, Deus inicia a Aliança com a humanidade e com a terra inteira. O arco-íris ou Arco da Aliança nos recorda a ligação amorosa de Deus com toda a criação. O primeiro mundo foi destruído, mas Deus não desistiu de nós. Em Jesus, promete-nos novo paraíso como ao Bom Ladrão na cruz: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso“ (Lc 23,43).
O Apóstolo Pedro nos recorda exatamente isto na segunda leitura de hoje ao resumir o Mistério Pascal de Cristo: “Cristo morreu, uma vez por todas, por causa dos pecados, o justo pelos injustos, a fim de nos conduzir a Deus. Sofreu a morte, na sua existência humana, mas recebeu nova vida pelo Espírito” (1Pd 3, 18) e ainda acrescenta: “A arca corresponde ao batismo que é a nossa salvação” (1 Pd 21). Assim, a nossa participação no mistério da Salvação se dá pela fé e pelos sacramentos: “Quem crer e for batizado será salvo, quem não crer será condenado” (Mc 16,16).
São Pedro ainda nos recorda que a salvação em Cristo atinge todos os homens, desde o primeiro Adão “No Espírito, Ele foi também pregar aos espíritos na prisão” (1Pd 3,19). E o que rezamos no Credo dos Apóstolos: “desceu à mansão dos mortos”.
O diabo sugeriu a Jesus agir contra Deus, mas ele não consentiu e não cometeu pecado. Para haver pecado, é preciso a tentação, mas o pecado só acontece quando damos nosso consentimento ao mal (o pecado de pensamento) ou cometemos o ato mal (atos e omissões). Continuaremos tentados pelo Mal em nossa vida inteira para nos afastar de Deus, mesmo tendo recebido a salvação pelo Batismo. Assim, rezamos com o Salmista: “Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos, e fazei-me conhecer a vossa estrada! Vossa verdade me oriente e me conduza, porque sois o Deus da minha salvação.Verdade e amor, são os caminhos do Senhor” (Sl 24). E Jesus nos ensinou a rezar: “Não nos deixeis cari em tentação, mas livrai-nos do mal”.
Que a Imaculada Mãe de Deus, preservada de todo pecado, e seu esposo São José nos auxiliem em nosso caminho de salvação.
+ Dom Miguel Angelo Freitas Ribeiro