O AMOR QUE RECONSTRÓI
A liturgia de hoje nos recorda que a Igreja não é a comunidade dos perfeitos, mas dos que, em Cristo, buscam a perfeição. Em nosso caminho, muitas vezes, nos enganamos, erramos e pecamos. Os irmãos e a comunidade inteira sofrem com nossos pecados e nós sofremos os pecados, incompreensões e erros dos irmãos. Diante desta realidade, o que fazer? Tanto o profeta Ezequiel quanto Jesus nos exortam à correção fraterna. Se corrigimos o irmão e ele se converte, ele se salva, se ele se perde por nossa falta, nos perderemos com ele (cf. Ez 33,7-9). Se cada um é responsável pela sua própria culpa, somos, como membros de um único corpo, responsáveis uns pelos outros. “Se um membro sofre, todos os membros padecem com ele; e se um membro é tratado com carinho, todos os outros se congratulam por ele” (1 Cor 12,26).
A correção fraterna, uma das obras de misericórdia, exige de nós alguns passos. Chamar o irmão em particular, com respeito, educação e cuidado; depois com algumas testemunhas e, finalmente, se for necessário, perante a comunidade e até afastá-lo da mesma. Este é o sentido da excomunhão, pena medicinal aplicada pela Igreja, para que o irmão se converta e se salve e que só se pode atingir os batizados.
Omitir a correção, embora nos seja o mais cômodo pelo desejo de não desagradar, não é amar nem querer o bem. Certamente hoje, em nossas comunidades, quanto maiores, mais difícil é exercer este ministério que só pode se realizar quando existe o amor mútuo e quando verdadeiramente o fazemos com a certeza de Jesus entre nós (Serva de Deus Chiara Lubich), portanto, com amizade fraterna, oração e caridosa advertência.
Todos necessitamos de correção, conversão e de humildade para acolher a advertência que nos é feita pelo irmão. “É verdade que toda correção parece, de momento, antes motivo de pesar que de alegria. Mais tarde, porém, granjeia aos que por ela se exercitaram o melhor fruto de justiça e de paz” (Hb 12,11).
“Hoje, religião e moral são muito privatizadas. Isto não é necessariamente um progresso! Pode ser uma maneira do ‘adversário’ para diminuir a consciência e a força moral do povo. A fuga na privacidade torna difícil o trabalho de transformação. As drogas, a pornografia, as alienações religiosas têm a ver com isso”. (Johan Konings)
Nossa vida não é tão privada assim. “Toda alma que se eleva, eleva o mundo”, escreveu a Serva de Deus Elisabeth Leseur. Mas, o contrário também é verdadeiro.
Se compreendemos nossa corresponsabilidade, também entenderemos melhor o Sacramento da Penitência, o porquê contar ao padre os nossos pecados. “Tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo que desligardes na terra será desligado nos céus” (Mt 18, 18). A Igreja pode impor penitência e tem o poder de perdoar em nome de Cristo (cf. Jo 20,19-23).
Muitos adoecem porque não conseguem perdoar, vencer a mágoa e o rancor. Cultivar mágoas e rancores é deixar se escravizar pelo outro, prendendo-se ao passado, como a mulher de Ló que se petrificou numa estátua de sal (cf. Gn 19). É petrificar-se na dor.
Jesus nos dá o remédio. Não hesitemos em exercitá-lo pela oração (cf. Mt 5,44) e pela correção fraterna (cf. Mt 18,15-20) e em buscá-lo, quando necessário, no Sacramento da Reconciliação. “Lembra-te do teu fim, e põe termo às tuas inimizades” Eclo, 28,8). Afinal, “o amor é o perfeito cumprimento da Lei (Rm 13, 10b) e sua plenitude.
+ Dom Miguel Angelo Freitas Ribeiro
* Imagem: materecclesiae