O AMOR QUE SUPERA A JUSTIÇA
A parábola dos operários da vinha continua a nos interpelar, como aos fariseus do tempo de Cristo. Para compreendê-la, é necessário colocar-se na perspectiva do Reino anunciado e inaugurado por Jesus.
O patrão sai para contratar empregados para sua vinha, em diversos momentos do dia, até às cinco da tarde, onze horas da manhã para os judeus, e trata, com cada um, o salário que lhe fosse justo. Quando chegou ao fim do dia, pagou a todos, indistintamente, com uma moeda de prata (denário), isto é, uma diária completa, pois necessitavam se sustentar. A insatisfação dos que pegaram mais cedo no trabalho e ao que lhes foi porta-voz, o patrão perguntou-lhe se ele estava com inveja dele causa de sua bondade.
Deus é o bom patrão, que paga a cada um segundo sua própria bondade e não segundo nossos pretensos merecimentos. Quem pode fazer o suficiente para com Deus, que tudo provê em nossa vida? Como dele tudo recebemos, por mais justos que sejamos, sempre estaremos a dever-Lhe. Assim, Ele não é injusto, mas apenas se mostra bom para com todos. O dom de Deus não pode ser merecido, é pura graça.
Isso significa que não devemos nos esforçar para ser bons? O próprio Senhor nos ordena cumprir os mandamentos de Deus (cf. Jo 14,23) e nos corrige quando erramos: “Eu repreendo e corrijo a todos quantos amo: sê pois diligente e arrepende-te” (Ap 3,19).
Nosso empenho deve ter sua origem na gratidão para com Deus que é sempre bom. O catecismo nos recorda no número 2092 o pecado de presunção: “Há duas espécies de ‘presunção’. Ou o homem presume de sua capacidade (esperando poder salvar-se sem a ajuda do Alto), ou então presume da onipotência ou da misericórdia de Deus (esperando obter seu perdão sem conversão e a glória sem mérito) ”.
Deus não tem a obrigação de nos salvar na última hora, como a São Dimas, perdoado quando estava a morrer na cruz! Mas, seremos, como ele o foi, capazes de um ato de amor e de arrependimento que nos abra as portas do Coração de Jesus, se nos acostumamos ao mal? “Abandone o ímpio seu caminho, e o homem injusto, suas maquinações; volte para o Senhor, que terá piedade dele, volte para nosso Deus, que é generoso no perdão” (Is 55,7). Por isso, o Apóstolo São Paulo, comparando-se aos atletas que, no estádio, buscam um prêmio perecível, escreveu: “Castigo o meu corpo e o mantenho na servidão, para que não venha a perder depois o que antes anunciei aos outros” (1Cor 9,27). E ainda: “Só uma coisa importa: vivei à altura do Evangelho de Cristo” (Fl 20, 27a).
A misericórdia de Deus supera a nossa justiça, porque “quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tm 2, 4) e alcancem a plenitude do Reino dos Céus, isto, é da comunhão com Ele.
O profeta Isaías já nos alertava em nome do Senhor: “Meus pensamentos não são como os vossos pensamentos, e vossos caminhos não são como os meus caminhos, diz o Senhor. Estão meus caminhos tão acima dos vossos caminhos e meus pensamentos acima dos vossos pensamentos, quanto está o céu acima da terra” (Is 55,8-9). Se damos por mal-empregada a bondade de Deus para com os irmãos, corremos o risco de não participar do banquete do Reino, pois seria um pecado contra o Espírito Santo.
Precisamos viver, de acordo com Cristo, “uma vida digna do Evangelho” (Fl 1,27). Um bom filho não pode cobrar de seu pai só porque lhe obedece. O Senhor nos ensinou a rezar: “Seja feita a vossa vontade, assim na terra como no Céu. ”
Que Nossa Senhora e São José, cujas vidas foram totalmente de acordo com a vontade de Deus, nos ajudem a percorrer, com alegria e esperança, esse caminho, muitas vezes, doloroso vale de lágrimas. Viver assim já é experimentar o céu.
E, pela graça do Espírito Santo que nos foi derramado, pela misericórdia de Deus que nos salvou em Cristo, alcancemos a plenitude do Reino e a plena comunhão com Deus, quando seremos, como bem expressou Santa Elizabete da Trindade, perene “louvor de glória” (cf. Gl 1,5) ao Pai e ao Filho e ao Espirito Santo.
+ Dom Miguel Angelo Freitas Ribeiro
* Foto: Centro Loyola
Viva o Espírito Santo!!!